Noite de "Solaris" na Cinemateca Brasileira


EXCELENTE PÚBLICO PARTICIPOU ontem (27-11-16), noite de domingo, do encerramento da mostra III MOSFILM-Cinema SOVIÉTICO E RUSSO ao ar livre, na Cinemateca Brasileira. Foi exibido o filme SOLARIS, de Tarkowski. Nem a chuvinha fina demoveu o público, que fruiu as quase três horas da densa narrativa tarkowiskiana (afinal trata-se do filme considerado, ao lado de “2001, Uma Odisseia no Espaço”, um dos dois momentos mais luminosos da história do cinema de ficção científica planetário). 

Antes, 17h45, apesar do jogo do Palmeiras (que mobilizava a cidade) plateia significativa ocupava uma das duas salas de exibição da Cinemateca Brasileira, para assistir ao filme “O Conto do Czar Saltan”, de Alexandre Ptusko, produção de 1966 (portanto, da era soviética). Quem pensa que o cinema da URSS vivia só de ‘realismo socialista’ não conhece a poderosa indústria audiovisual do país eurasiano. SALTAN, exibido em cópia restaurada, novíssima, magnífica em suas cores vivas, com legendas grandes e de boa qualidade, encheu os olhos de quem gosta de filmes fantásticos. Baseado em poema de Pushkin e transformado em ópera por Rimsky-Korsakov, o filme tem trilha sonora de Gavril Popov e conta estórias de reinos povoados por lindas princesas, czares poderosos, irmãs invejosas que tudo fazem para privar a escolhida pelo czar para ser sua czarina de sua felicidade, súditos fieis e um “tutor” disposto a praticar todos os golpes baixos possíveis. Tudo no terreno do “maravilhoso”, com exércitos de guerreiros gigantes magnificamente vestidos saindo das águas, esmeraldas e pepitas de ouro de brilho ofuscante, esquilos cantando, princesa encarnada em cisne, um príncipe que cresce a cada minuto e se transforma num belo mancebo em pouquíssimo tempo, etc, etc. O lendário eslavo ganha representação luxosíssima. Efeitos especiais de ponta, a cargo de Ptushko, considerado “o mestre dos efeitos especiais do cinema soviético”. Segundo folheto da Mostra Mosfilm III (que terminou ontem em SP e prossegue na Sala P.F. Gastal, da Cinemateca Capitólio, em Porto Alegre) “Saltan recebeu adaptação do mestre dos efeitos especias, cujas animações se integram à realidade fílmica com raras inteligência e leveza”).

Estive nas três edições paulistanas da Mostra Mosfilm, organizada pelo CPC-UMES. E constato que ela está em franco crescimento. Este ano, ganhou magnífica sessão ao ar livre (com cópia tinindo de nova de SOLARIS), dialogou com o cinema brasileiro (pré-estreia e debate de “VERMELHO RUSSO”, do brasileiro Charly Braun, com as atrizes Martha Nowill e Maria Manoela) e, além da barraquinha de DVDs russos e soviéticos, cujo maior destaque é o maupassaniano “Bola de Sebo”, de Mikhail Romm), os amplos jardins da Cinemateca (na Vila Mariana) ganharam concorrida barraquinha com comidas russas. Não faço a menor ideia do tamanho da comunidade russa em SP. Mas vi algumas pessoas falando russo e curtindo as comidas típicas, os espaços da Cinemateca e os filmes. E, claro, uma maioria de jovens brasileiros ligados ao paulistano CPC-UMES (Centro Popular de Cultura da União Municipal de Estudantes Secundaristas de São Paulo). ***Em 2017, centenário da revolução russa, o festival MOSFILM, em sua quarta edição, deve crescer ainda mais. O CPC-UMES, que de vez em quando ouve minhas sugestões e pitacos, deve criar (sugiro!), para o próximo ano, um significativo Núcleo Histórico, capaz de contar, através de filmes, a história dos dez dias que (em outubro de 1917, pelo novo calendário, novembro) abalaram o mundo. A parceria com a Cinemateca, com a Mosfilm, com o jornal Gazeta Russa, etc, podem ajudar muito. E — fundamental — há que se organizar cursos, debates e trazer um grande nome do cinema contemporâneo russo (quem sabe Andrejy “Leviatã” Zvyagintsev, Sergei Loznitsa ou um dos irmãos Nikita e Andrei Konchalowski) para uma masterclass ilustrada com trechos de filmes. Ou um g rande crítico russo, que, num curso, ou masterclass, possa nos contar uma bem ilustrada e matizada história do cinema russo-soviético-russo. Enfim, um festival que por dez dias abale a cinefilia paulistana.


Maria do Rosário Caetano, publicado originalmente no Almanakito - http://almanakito.wordpress.com - em 28/11/2016


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